Como fazer arte à distância
artistas brasileiros, isolados do mundo, precisam mais do que nunca aprender com isso.
Oi gente, esta é a segunda edição da minha newsletter.
Obrigada por deixar a Fritness entrar no seu inbox mais uma vez. Meu nome é Vivian Caccuri, sou artista plástica e estou trabalhando com música, som, instrumentos musicais e mosquitos.
Depois do sucesso inesperado do botão “mande um zap pra Vivian”, resolvi descontinuar esse canal. Brincadeira. Manda um zap pra mim pra gente trocar ideia!
Nesta edição
Montagem de um trabalho meu no High Line NYC, trabalhos que foram feitos à distância durante a pandemia, dicas de como lidar com essas mudanças e dois presentes pra vocês.
Presentinho n.1
Assim que é bom, já começamos com presente. Divulgação exclusiva da Fritness: finalmente meu disco “A Soul Transplant” está disponível no Spotify. Junto com Sven Lidén, criei uma conversa musical entre mosquitos e um órgão de igreja na Suécia. Ouça um trecho:
Para ouvir inteiro só clicar aqui.
Presentinho n.2
Se você curte vinil e quer ouvir esse disco com mais sensações, ele está à venda pela 55sp. Estamos dando um desconto de 25% especialmente pra vocês, leitores da Fritness! O disco inclui um poster com meus desenhos de mosquito que é só pendurar na parede (ou emoldurar pras modernistas). É só digitar o cupom FRITNESS na loja da 55sp. Só vale até a próxima newsletter!
Aaah, o sorrisinho pré-2020…
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É isso amigos, até a Coreia do Norte que nunca permitiu entrada de brasileiros, nos baniu DE NOVO por conta do descontrole total da covid-19. Uma espécie de banimento ao quadrado de brasileiros, nos baniram até o âmago. Sinceramente, neste momento onde a situação nacional levou à triplicação da população abaixo da linha da pobreza, dá até vergonha de falar sobre “não poder viajar” ou “fazer arte no exterior”. Mas o meu sentimento de culpa não deve falar por uma cultura inteira que está prestes a se isolar completamente de outros continentes. Peço que vocês levem em consideração o lugar de desigualdade que me permite falar sobre essas coisas, coisas que são acessórias demais em face do não ter o que comer.
Quem já me acompanha no meu instagram, sabe que eu sempre gostei de fazer projetos para lugares específicos. Muitos trabalhos são pensados e concebidos especialmente para um lugar. Foi o caso do A Soul Transplant, a instalação sonora que deu origem ao disco ali de cima, feita totalmente do zero na Suécia.
Mas agora acabou. Não o trabalho, mas essa forma de fazer. Primeiro, não existe a possibilidade de brasileiros viajarem para trabalhos não-essenciais. VALEU genocida! Segundo, a maioria dos museus está fechada e repensando a presença do público no espaço interno. Diante disso, comecei a experimentar novas formas de produzir. Não estou de jeito nenhum querendo dizer que dominei a situação, ou que não estou sendo afetada pela crise, porque obviamente quem disser que está no domínio de qualquer coisa agora está nos braços da positividade tóxica.
Reproduzir (e ampliar) um trabalho existente
Refazer ou reproduzir um trabalho que já existe não é tão fácil assim. Primeiro, você deve gostar muito desse trabalho pra ver dois dele expostos no mundo. Segundo, nem sempre passar medidas, materiais, um manual e esperar que tudo dê certo, funciona. É inevitável aceitar a diferença do original para a reprodução. Resignação é uma das etapas do fazer. Observe as três diferente versões do Concreto SoundSystem em três países, Brasil, Índia e Alemanha, cada uma com uma textura particular e esquemas de montagem que se adaptam aos espaços e recursos de cada exposição.
Mas uma notícia que quero contar é que outro trabalho, o Odebrecht Soundsystem estará no fim deste mês no High Line Art em Nova Iorque por um ano. Esse trabalho é um paredão estilo Furacão 2000, mas coberto por vidros de edifícios corporativos. É como uma miscigenação/briga arquitetônica entre soundsystem e prédio empresarial.
Se teve algo que eu coloquei todo meu esforço (e do meu querido produtor Eloy Vergara) foi para que o Odebrecht Soundsystem soasse grandão em Nova Iorque. E estou bem acompanhada de Mulú (aka. Omulu): assinamos juntos a trilha que está coreografada com luzes que fazem o paredão piscar. Olha como era o croqui original:
Levando em consideração tamanho megalomaníaco, orçamento, restrições do parque, limites técnicos do vidro, fiz uma série de modificações. Olha como está ficando:
Tem diferença? Com certeza. Estou insatisfeita? Só se eu for louca. Moral da história 1) artistas preparem sua internet e seu Google Calendar, porque não existe fazer trabalhos remotamente sem uma dúzia de zooms, outra dúzia de wetransfers, manuais e muita imaginação 2) artista, se mesmo durante a pandemia você continua tendo ideias fixas e se apega ao esboço original, tem dificuldades em aceitar as mudanças, briga com curadores e com todo mundo, sua carreira está em perigo. Seje menas e aceite o fluxo.
Construir objetos por instruções
Fazer obras de arte à distância ou por meio de instruções já era uma inovação do Fluxus nos anos 70. A separação entre mão e mente era uma forma de exagerar a qualidade metafísica do objeto e colocá-la em primeiro plano. Pois bem, além de tudo, isso vai ser bem útil hoje.
O trabalho que desenvolvi com a Galeria Carbono foi 100% feito por meio de instruções durante a pandemia, sem nenhuma visita pra ver como anda a produção. Foram muitas trocas de mensagem e fotos para colocar um objeto no mundo que valha a pena, junto a um time de super mulheres. É um triângulo como os de forró, mas feito totalmente em vidro que pra mim resume bem a sensação pós-2020: não importa o quanto empolgadx você esteja, segure a sua onda e toque pianinho pois o perigo é real.
Foi feito em formato múltiplo, ou seja, existem edições (cópias). Ouvi dizer aqui que ainda há algumas disponíveis.
Minha principal dica
O que eu considero importante - especialmente para artistas jovens - é o que importa não são só os dribles na adversidade para continuar fazendo arte como se nada estivesse acontecendo, mas também as novas relações de confiança que temos que criar com nossos colaboradores, com os museus, com as galerias, com todxs aquelxs que topam a loucura de continuar trabalhando com um artista brasileiro no meio de uma pandemia.
AME e NUTRA a sua rede de amigos e parceiros, pergunte como estão, converse, pergunte se tem algo que você pode ajudar através do seu trabalho ou de coração. Nosso trabalho precisa servir, ele precisa apontar caminhos e inspirar, ele não deve ser uma perspectiva narcísica e egoísta. O Brasil, como potência cultural que é, precisa de pessoas emocionalmente saudáveis e redes mais fortes para sobreviver. Se não dá para curar a pobreza através da cultura, dá para aprofundar nossas relações para que se encontre significado comunitário, para que se escape do desespero, da loucura individual e coletiva. Artistas são sim necessários, são sim essenciais. Só paramos de ser quando nos perdemos no auto-isolamento e na vaidade.
NFT e a perspectiva das galerias e feiras gringas
Artigo excelente, não é pago, mas é em inglês. Prepare-se para visões otimistas e outras nada animadoras:
https://www.japantimes.co.jp/culture/2021/03/22/arts/art-world-pandemic/
Acabou de sair essa semana. É só sobre NFT, também em inglês.
O que você quer ouvir?
Fala pra mim, o que você gostaria de ler na próxima newsletter?
Arte e Natureza: artistas e trabalhos transcendentes + listinha surpresa
Som e saúde: terapias reais e impostoras, alguns fatos chocantes e estratégias pra lidar com um mundo cada vez mais barulhento.
Você leu tudo! Muito obrigada por mais um mês.
beijo grande,
Adorei o tema e a newsletter! Obrigada pelas reflexões :) Adoraria ler o que escreveria sobre Arte e Natureza! Amo